OS GRANDES DESAFIOS DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO BRASIL

Democratizar, integrar as políticas, universalizar o acesso e garantir qualidade pedagógica: os grandes desafios da Educação Profissional no Brasil

Jacy Afonso de Melo*

A Constituição de 1988, no seu Artigo 6º, consagrou a educação como sendo o primeiro de todos os direitos sociais, apontando como diretriz para a sua materialização, a necessidade de um processo consistente de integração dos diferentes sistemas de ensino, respeitando-se o pacto federativo, que devem coexistir em regime de colaboração.

Tal diretriz coloca-se como um princípio essencial da atual política educacional brasileira por duas razões: aponta para a necessidade de um Sistema Nacional de Ensino que reflita maior coesão entre as políticas e estratégias educacionais para democratizar e universalizar o acesso e permanência na Escola e, do ponto de vista pedagógico, indica a possibilidade de se avançar na superação da histórica dualidade entre formação propedêutica e formação técnica-profissional. Estas duas razões, por si só, já nos indicam a dimensão estratégica das definições que o país terá que assumir frente às perspectivas de consolidação de um projeto de nação baseado no desenvolvimento com sustentabilidade econômica, social e ambiental.

Neste contexto, para nós, trabalhadores e trabalhadoras, já passou a hora do Brasil superar entraves históricos que envolvem o tema da educação profissional. Sabemos que o mercado de trabalho contemporâneo vem exigindo cada vez mais mão-de-obra qualificada e, mesmo os setores que apresentam alta rotatividade, demandam do trabalhador que entenda os fundamentos do trabalho que está realizando porque, independentemente do posto de trabalho que ocupa, as inovações técnicas e tecnológicas tornam cada vez mais complexo o exercício profissional.

Por esta razão, há muito tempo chamamos a atenção para a insuficiência de políticas no campo da educação profissional, sobretudo daquelas voltadas para os trabalhadores jovens e adultos, assentadas no velho paradigma de "treinamento/adestramento" para funções repetitivas, característica do modelo fordista de produção, que não atendem às características e às necessidades dos trabalhadores e trabalhadoras brasileiros, servindo apenas para a reprodução das profundas desigualdades que ainda persistem em nosso país, bem como para a precarização das condições de trabalho.

Quando apontamos como principais desafios da educação profissional no Brasil, a democratização, a integração, a universalização e a qualidade pedagógica, estamos nos referindo exatamente às condições necessárias para o salto de qualidade que o país precisa dar para se consolidar, efetivamente, como uma nação desenvolvida. São quatro dimensões que não estão dissociadas uma da outra.

Democratizar significa ampliar a oferta em sintonia com a realidade e características produtivas territoriais; significa definir políticas e estratégias que respondam às necessidades efetivas para o desenvolvimento humano dos trabalhadores, sem que tenham que deixar sua terra natal em busca de sonhos nas grandes metrópoles; significa compreender a formação profissional e a própria profissão como constituintes do processo educativo.

Se por um lado é verdade que o Brasil não dispõe da quantidade suficiente de mão-de-obra qualificada que o mercado, altamente competitivo, hoje demanda, por outro, não é verdade que não dispomos de uma infra-estrutura adequada para o enfrentamento deste desafio. Nos últimos anos, tivemos investimentos significativos na ampliação da Rede Federal de Educação Técnica e Tecnológica, e nas Redes Estaduais. O "Sistema S" está presente em inúmeros municípios das diferentes regiões do país, com escolas estruturadas para atender demandas da indústria, do comércio e serviços, do transporte, entre outros setores.

Se a educação profissional é uma das dimensões do processo educativo de homens e mulheres, direito consagrado na Constituição de 1988, definir políticas e estratégias que garantam o acesso de todos e todas é obrigação do Estado. Neste aspecto, mesmo reconhecendo os investimentos e os avanços ocorridos nos últimos anos, persistem ainda dois grandes gargalos no campo da educacional profissional que impedem avançar no processo de universalização, quais sejam:

a) A necessária integração entre as políticas que são desenvolvidas entre a Rede dos Institutos Federais de Educação Técnica e Tecnológica, as Redes de Escolas Técnicas Estaduais, buscando-se precisar oferta e demanda, evitando-se sobreposições;

b) As políticas e estratégias entre as Redes Públicas (Federal e Estaduais) com o setor privado, particularmente com o chamado "Sistema S".

Necessitamos, portanto, de vontade política e investimento em processos de diálogo social, envolvendo governos, empresários e trabalhadores, para que toda esta "malha" de escolas existentes esteja sintonizada na busca da universalização do acesso.

Por fim, é importante dizer que a educação profissional que faz avançar rumo à superação das desigualdades deve eliminar a dicotomia entre o trabalho manual e o trabalho intelectual, formação geral e formação profissional, uma educação profissional que possibilite a compreensão do mundo e a incorporação pelo trabalho dos conhecimentos científicos, no contexto da vida e da sociedade (Saviani).

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*Jacy Afonso de Melo é bancário do Banco do Brasil, conselheiro do CDES, secretário de organização da Central Única dos Trabalhadores, diretor do DIAP e membro do Conselho Curador FGTS e do Comitê Gestor do Fundo de Investimentos do FGTS.

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